Finalmente, era
chegada a hora de Clara voltar a se juntar a seu grupo e me levar junto com
ela. Eu cumprimentava a todos na roda, desde Leandro, um velho conhecido meu e
primeiro amor de Clara, que também estava a beber com o grupo desde a tarde, e
tinha feitos incrÃveis em sua bagagem para contar e os contava, como a vez em
que fez o percurso a pé da trilha Inca, uma estrada pavimentada com pedras que
atravessa algumas montanhas da Cordilheira dos Andes até Machu Picchu, mas
calçando um par de All Star creme e
passando com eles desde as pedras, a terra, água e até neve. É claro que seus
pés resistiram a tudo isso, mas não intactos, as bolhas pareciam fazer parte
deles e parte de seu pé ficou em carne viva.
Até que de repente
um olhar, contornado com um lápis, que ornava com a Ãris negra que me penetrava
sem pedir licença ou bater na porta indo em direção ao que eu tinha de mais
intimo. A dona daqueles olhos diretos era Selene, a única pessoa eu não
conhecia na roda e a única que me cativava de relance com um olhar. Ao me ver
entrar pelo portão da festa acompanhado por clara Selene puxou Maira de canto:
-Nossa! Quem é esse
cara?
Naquele momento a
duvida começou a habitar os pensamentos de Maira, o tempo que parecia ter
apagado o tato e o bom relacionamento entre ela e Selene, a ponto dela não
saber o que realmente passava pela cabeça bêbada de Selene com aquela pergunta,
será que ela me trataria como tratou Clara? Mas mais uma vez na dúvida, Maira
mais uma vez preferiu não sair de seu mundo superficial e não incomodar com
qual seria a atitude de Selene, ela apenas explicou quem eu era e depois se
fodeu para o que poderia acontecer dali pra frente.
Após essa
explicação, Maira tratou de procurar um lugar onde seus olhos não pudessem me
ver ou ver Selene poderia fazer comigo e levou Clara junto para evitar maiores
problemas. Enquanto isso, eu fui preparar meu drink de verão (vodca com alguma
coisa) e logo voltei à roda, sem saber como puxar assunto com o restante e
ofereci bebida para quem aparecesse a minha frente, eis que era chegada à hora
de oferecer para Selene.
Lá estava eu de
frente com aquela garota com o cabelo que refletia a luz da lua, uma verdadeira
delÃcia de um pouco mais de 1,60m, seios fartos e aquele olhar que me
desconcertava e aos trancos e barrancos falei bem baixinho a Selene “Servida?”,
ela não havia entendido direito o que eu havia lhe falado por causa do tom
baixo da minha voz, se aproximou pedindo para repetir o que eu havia falado. Em
seguida ainda desconcertado repeti em um tom mais alto e fiz um sinal mostrando
o copo.
“Não obrigada, vou
ficar só na cerveja hoje”, respondeu Selene, erguendo sua lata para mostrá-la a
mim e abrindo um sorriso insinuante e diabólico mostrando que podia deixar de
ser aquela menina mimada e infantil sábado para ser a deusa das trevas, que me
seduzia com qualquer gesto que fazia, ou com qualquer movimento que sua em sua
camisa de gola V transformando seus seios em dois imãs gigantes que atraiam os
meus olhos para aquele decote. O álcool finalmente começava a fazer o seu papel
naquela noite, socializando Selene, ou pelo menos tirando-a da solidão de seu
mundo e mostrar que havia vida a sua volta.
A boca e o papo mole
como “Estou evitando beber destilado, porque quando eu o misturo com meu tarja
preta (remédio) fico meio louca” eram mais indÃcios do poder do álcool naquela
mente perturbada e de corpo escultural que o tentar ficar mais próxima e intima
do meu corpo e conversar mais de perto e quase caiu do banco em que estava
sentada.
Ao evitar tal cena
ridÃcula notei que meu inconsciente pretendia me levar onde a minha consciência
não permitia e sem perceber minha mão segurava fortemente a coxa de Selene e
que me levava a querer cada vez mais, era como se a minha mão se tornasse mais
uma estrela a brincar no imenso tapete de estrelas que o céu que antes era
negro agora era cÃtrico das cores de sua calça, mas os puderes e minha caretice
impediram de seguir em frente no meu tapete de estrelas e colocasse os pés no
chão, automaticamente tirei minha mão de sua coxa um pouco constrangido com aquela cena,
constrangido comigo mesmo.
Seria ironia do
destino, destino esse desacreditado por mim, ou apenas ironia momentânea? A
mesma garota que havia esbanjado hostilidade e ferradura a todos durante parte
daquele sábado havia se transformado em outra pessoa, sendo simpática, mesmo
depois de perceber minha mão em sua coxa, manteve aquele sorriso diabólico e
sem legendas combinado com um olhar que penetrava minhas pupilas e invadia a
minha mente.
O mesmo olhar que
não me dava à certeza de nada e que me invadia era o que transformava nossa
conversa em um cinema mudo, onde todas as palavras, ideias, mãos, gestos,
pareciam não possuir vida, era apenas a natureza morta de dois corpos
envolvidos pelas mÃsticas de dois pensamentos, sentimentos e olhares.
Enquanto as casas
vizinhas começavam a apagar os televisores, após verem seus queridos ancoras
fazerem apologias a algum tipo de conduta aprovada por quem nascia para oprimir
e tinha medo de ser oprimido, era chegada a hora de Clara voltar para a festa e
me encontrar com Selene. Ela parecia não entender o que seus olhos acabavam de
ver, afinal que diabos eu estava fazendo? O porquê eu estava cada vez mais envolvido
com Selene? Por que estávamos cada vez mais isolados mesmo estando dentro de
uma festa? Quais eram as intenções de Selene? Por que dela ser legal agora?
Porque nada naquele local nos interessava a não ser por nós mesmos?
Clara notou que o
tempo que havia passado sob a luz da lua com Maira, do lado de fora da festa
serviu para unir Selene e eu e a cada minuto que passava aquilo se transformava
em uma fortaleza quase impenetrável, fato que incomodou à primeira vista Clara
que, além de nos ver juntos, viu que quase todos de nossa roda dispersarem, o
que, para ela, ajudou na aproximação entre Selene e eu.
O ciúme era evidente
na face de Clara e percorria cada vaso sanguÃneo de seu corpo fazendo o seu
sangue subir a cabeça. Não existia nenhum sentimento especial dela por mim a
não ser a amizade, e algumas lembranças de algumas transas, nenhuma delas tinha
importância para ela e também não tinha para mim, Clara não estava disposta a
entrar em nenhuma disputa com Selene, mas após passar parte do dia com Selene
ela perceberá que existiam muito mais diferenças entre elas do que apenas o mal
entendido na parte da tarde, Clara não confiava em Selene e nem em suas
intenções comigo e nem em minhas intenções com Selene, no fundo ela sabia que
Selene tinha potencial para ser uma encrenca para nós e nossa amizade que ao
mesmo tempo que era forte, era sensÃvel
e tão frágil como uma casca de ovo.
A amizade também era
o motivo pelo qual Clara não me deixava crescer com meus próprios erros e
sempre me tirava da linha de tiro, me
deixava ileso aos chumbos de outras noites, mas Selene poderia ser a bala
perdida que me acertaria em cheio, e sem ter confiança em Selene e não saber no
que tudo aquilo poderia dar, Clara veio como um vulto por trás de mim enquanto
eu prestava atenção no que Selene e falou de forma suave e bem humorada no meu
ouvido para que ninguém percebesse suas intenções:
“Não vá furar meu
olho, seu desgraçado!” e recuou rindo e com um sorriso no canto da boca sabendo
que aquelas palavras poderiam fazer na minha alcoolizada mente, ela havia
plantado a semente do desconforto na terra fértil em minha consciência e isso
para ela já era motivo de sobra para tirar aquele sorriso sagaz e dar a certeza
de que ela havia marcado presença.
Aquele era mais do
que uma provocação a Selene, Clara parecia estar declarando guerra a Selene da
mesma forma que Selene fez com ela na parte da tarde, a antipatia entre as duas
partes era evidente, não trocaram uma palavra durante toda a festa até então,
se comunicavam apenas por olhares nada amistosos. Era como se eu estivesse no
exato ponto onde dois rios se encontram e me afogasse no meio de duas
correntezas que se colidiam.
Por outro lado não
era de Clara se envolver em qualquer tipo de relacionamento que não fosse Ã
pessoa que estivesse com ela, mas principalmente ela não disputava nada com
ninguém, era preferÃvel viver a arte de perder e ser feliz ao vencer sem ter
amor e decidiu retirar a ganancia de vencer em nome de algo maior, o amor por
mim. “Só não quero que você se machuque”, disse Clara antes de desaparecer
entre as pessoas na festa.
“O que ela queria?”,
me perguntou Selene com uma voz carregada de cobrança de quem mesmo bêbada
tinha a certeza de que Clara tinha mais intenções que 5 minutos de fama em
nosso infinito particular.
Tentei disfarçar e
de forma mais dissimulada e me fiz de desentendido com a intenção de jogar a
merda para debaixo do tapete a cena que acabara, enquanto Clara tinha evaporado no meio de tantas pessoas
parecendo estar cagando e andando para o mundo, ou pelo menos não tendo saco o
suficiente para levar o mundo sério, ela voltará a para beber com o resto do
grupo enquanto Selene questionava em mais se Clara queria que eu ficasse com
Maira, aquela era mais uma cena ridÃcula do qual Selene protagonizava, não
deixando dúvidas do quanto álcool corria em suas veias.
Após negar toda
aquela besteira com a inocência de ter sido absolvido pelo nÃvel alcoólico de
Selene, a harmonia voltara ao para nós e nosso mundo particular, composto de
muito álcool e hormônios reprimidos por algum pudor que poderia facilmente ser
esquecido após mais uns goles. Trago a trago tornava mais fácil, confortável e
gostoso me ocupar apenas os olhos e os olhares de Selene, com meus ouvidos
sendo invadido pela voz dela e sua boca fazendo gestos e movimentos que mexiam
com o meu libido, deixando às vezes o dialogo em segundo lugar, para que a
sensualidade dos gestos de sua boca e seios fossem os protagonistas de meus
olhos.
Um trago atrás do
outro confundia a matemática de copos nosso e aumentava mais e mais a nossa
afinidade, parecia ficar cada vez mais difÃcil alguém conseguir invadir a bolha
que nos envolvia. Era difÃcil entender o que estava acontecendo entre nós,
parecia que aquela primeira troca de olhares se tornou a união perfeita para
aquela noite, mas havia gente disposta a estragar, um deles e o principal era
Ricardo, que estava do outro lado da festa com JanaÃna. Os dois davam uma
amostra de que seriam mais uma vez o casal Sid & Nancy da noite, a briga da
vez foi porque a mente movida a demência de Ricardo havia ignorado a presença
de JanaÃna mais uma vez para comer Selene com os olhos.
Parecia não existir
motivos ou forças que afastasse Ricardo de seus hormônios, nem mesmo o seu
relacionamento com JanaÃna poderia deter o tesão que ele sentia por Selene e
seus belos seios que arrastava seu olhar como um imã naquela
noite e o fato de não ser correspondido só excitava mais aquela pobre mente
perturbada e aumentava sua vontade de
possui-la naquela noite.
O seu desafio era maior,
para realizar o desejo de seus hormônios em
comer Selene, ele teria que
quebrar o elo existente entre eu e ela que formou uma áurea de intimidade entre
nós, algo que a mente débil de Ricardo compreendia, mas sua natureza animal
não, ou se entendia fazia questão de nega-la, e fazendo parte de sua natureza
xucra o que não era aceito ou compreendido era motivo de incomodo para ele, foi
nesse momento que se deu conta de que eu o incomodava desde que pisei na festa
até aquele exato momento.
Querendo colocar um
fim naquela aflição que sentia por estar longe dos seios de Selene e ao mesmo
tempo querendo colocar a raiva que ele estava sentindo por mim pra fora,
Ricardo comia Selene com os olhos assim como triturava cada osso de meu corpo
apenas com o seu olhar. No fundo ele sábia o que tinha que fazer, acabar com o
seu sofrimento ou pelo menos naquilo que não o agradava.
Como se estivesse em
uma floresta, o caçador Ricardo inicia a caçada da forma errada, era como se a
cada passo dado floresta adentro o barulho de seus pés espantasse suas vitimas,
e dessa forma ele invadiu o nosso mundo sem cêrimonia e, sentando-se ao meu
lado, inclinado a sua cabeça para perto de nós, apenas para ter certeza que
havia sido notado começou a jogar reclamações ao vento. “Meu ela não podia ter
feito isso comigo, não podia mesmo, ela não tem a mÃnima noção de como eu me
sinto”, falava Ricardo meio gritando, meio chorando, meio que sem noção,
balançando a cabeça e vendo nossos olhares de incompreensão aquela cena
ridÃcula que ele estava a fazer.
Apesar de parecer um
retardado bêbado Ricardo sábia a péssima impressão que sua amadora
interpretação havia deixado em nós, e seguindo a risca o manual do grande
canalha que ele era tratou de assumir o papel de vÃtima e se eximir dá culpa de
ser ridÃculo:
“Por que vocês estão
me olhando assim? Ah, tá. Entendi. Eu estou atrapalhando vocês, me desculpem
não foi minha intenção” e saiu batendo o pé enquanto mostrando que o cinismo
era a principal caracterÃstica daquele demente disfarçado de Dom Juan do
manicômio. Ricardo pretendia voltar e voltaria mais tarde como uma última
tentativa de ter Selene naquela noite.
O álcool passou a
ser o nosso combustÃvel para ativar a nossa criatividade para não nos deixar
cair na mesmice, entre uns tragos, sorrisos e risadas, ele passou a ter outro
papel e mais cruel, o de interrogador, transformando o nosso mundo em uma
grande interrogatório onde as verdades que se escondiam atrás de nossos olhares
saiam uma a uma de nossas bocas, o primeiro delator fui eu que deixei escapar o
que estava em seus pensamentos até aquele momento:
-Eu acho que o
planeta é tão grande que deveria existir no mÃnimo 6 pessoas iguais a você.
Acredito que o mundo seria melhor com isso, ou pelo menos eu poderia trombar
com uma dessas pessoas que parecem você e me sentir um pouco como eu me sinto
agora.
“Eu não gostaria que
houvesse outras pessoas iguais a mim nem neste mundo nem em outro. E se
existissem, eu não iria querer que você
as conhecesse, você só teria a mim, serei a única Selene na sua vida” me dizia
Selene enquanto passava a mão em minha barba forma carinhosa.
Mesmo atordoada pela
suicida mistura de tarja preta com a cerveja e o que acabará de ouvir da minha
boca, Selene não se sentia invadida e nem forçada a ouvir as besteiras que eu
dizia ao pé de seu ouvido, pelo contrário, ela escutava tudo com vontade e seu
olhar sedutor e sorriso diabólico me convidavam para entrar onde nenhum ser
humano naquele local, exceto Maira, havia pisado, tocado e deixado a sua
saliva. Sentindo-me quase um desbravador, exceto por um detalhe, não era eu que
a desbravava e sim ela que me conduzia pela mão pelos caminhos que que
estivesse à vontade para me levar.
O brilho vindo do
sorriso diabólico, disfarçado de sem graça era mais um convite que eu recebia
para entrar enquanto o seu olhar penetrava no fundo de minha Ãris hipnotizando
com aquelas duas pedras negras e mágicas, que brilhavam sobre a luz do luar
daquela noite e me deixava vulnerável as suas vontades.
Nossos olhares
pareciam finalmente terem se casado naquele momento em que nossos olhos se viam
atraÃdos um pelo outro e que o silêncio imperava entre nós, em transe, olhando
um para o outro como se pudéssemos habitar um dentro do outro. As mãos de
Selene continuavam a deslizar pela minha barba e nossos rostos estavam cada vez
mais próximos um do outro e parecia que finalmente os lábios de Selene e
encontrariam aos meus, quando dois rapazes que empunhavam em suas mãos uma
garrafa de rum e outra de vodca enquanto em quanto o outro segurava uma de groselha
e os dois saiam pela festa embebedando a todos com essa mistura que tinha gosto
de xarope e efeito de entorpecente, nos abordaram, sem se importar com o que
estava acontecendo naquele exato momento.
Aqueles animais
alucinados pela mistura de hormônio com álcool não ligavam para o que acontecia
a sua volta e sim que as pessoas estavam ou não suficiente bêbadas para se perderem em uma romana selva de dor e
transarem umas com as outras no final da noite.
Aquela mistura de
merda com porra nenhuma, das doses de rum, vodca e groselha, desceram queimando
nossas gargantas sem que ao menos nós notássemos que aqueles dementes haviam
invadido nosso mundo e jogado tudo que estávamos passando para o ar. O momento perdido e aquele gosto maldito em
minha boca me incomodaram, perguntei a Selene se ela queria mais uma cerveja e
fui fazer mais um drink para tirar aquele gosto de merda da boca.
Ao ir de encontro
com a bebida vi Ricardo aproveitar de minha ausência e aproveitou e com seu
instinto de abutre esperou apenas a oportunidade para dar aquela que seria sua
última e definitiva investida em Selene. Dessa vez, ele estava disposto a agir
de forma rápida, dentro de sua mente sem lógica e fora de orbita Ricardo tinha
a certeza de que só precisava estar lá, no mesmo lugar que eu estava e
combinando a luz da lua, o frio da noite, seu olhar, lábios e a e porre que ela
tinha tomado durante todo aquele sábado era a combinação perfeita para que
enfim ele a conseguisse beijar.
Os lábios que quase
se encontraram os meus desejavam passar longe dos de Ricardo e assim que Selene
notou Ricardo ao seu lado mais uma vez mostrou todo o poder que o álcool tinha
sobre a sua pessoa e deixou escapar de forma espontânea as palavras que
entrariam pelos ouvidos dele como se fosse uma faca entrasse e cortasse de cima
para baixo seu orgulho:
-De novo você por
aqui!
Foram poucas
palavras que escaparam de Selene, mas elas tiveram um efeito devastador na
mente de Ricardo, ou no que restava dela, principalmente pelo desprezo nelas
embutida, expondo Ricardo a algo que ele não havia passado ainda em sua vida. A
partir daquele momento a noite passou a custar caro para Ricardo.
Mil coisas passavam
por sua mente débil, mas nenhuma mudava o fato dele viver uma ilusão solitária
e só se dar conta de que realmente ele havia se tornado uma piada depois do
acontecido, escorraçado como um cachorro de rua.
A melhor saÃda
encontrada por Ricardo foi o silêncio, silêncio acompanhado da cabeça
cabisbaixa, saindo sem olhar para trás, sem sentir arrependimentos, vergonha ou
qualquer outra coisa que pudesse acusar sua consciência de novo.
De longe, pela
primeira vez na festa, eu tomei a mesma posição de omissão que Maira tomou
horas antes, mas no fundo eu sábia que aquilo era necessário, por meio daquela
cena bizarra eu pude ver todos os lados e faces que Selene possuÃa.
Mesmo não aprovando
a forma que ela agirá naquele exato momento, eu sábia que em seu lugar eu
agiria dá mesma forma ou até pior, e no fundo estava sendo apenas mais um filho
da puta de um conservador que não nota que os erros e atitudes tomadas sem
pensar mostram a capacidade de ser humano, a capacidade de errar e depois viver
tempo o suficiente para aprender com o erro.
Era chagada a hora
de finalmente aceitar Selene como ela realmente era. Passei a ver Selene como
um tÃpico e clássico personagem de Kerouach, contraditório e apaixonante, capaz
de me deixar perplexo ao ler cada movimento dela ou causar frisson a cada toque
dela em minha pele.
Ao voltar para o meu
destino ou o meu acaso naquela noite, o de estar ao lado de Selene, só que
agora com uma diferença, o lugar habitado apenas por nós dois estava lotado
após a cena com Ricardo e quando eu cheguei para me sentar Selene me puxou para
fora da roda, ela queria para dar uma volta.
As pernas que
andavam sem direção, cruzando uma com a outra, em ruas que se distanciavam cada
vez mais da festa e nos aproximavam cada vez mais de nossa verdadeira essência,
era como se cada passo que nós déssemos era um passo mais próximo de nossas
verdadeiras faces, bêbadas, loucas e sedentas uma pela outra. Após uma noite
toda de pileque e encrencas, era chegada a hora que ensaiámos ao longo de toda
a festa e não tivermos a oportunidade ou coragem suficiente para desenrolar,
era a hora de parar de adiar o que parecia inevitável e pôr um ponto final
naquela história.
Em meio às risadas e
o clima colorido, Selene não aguentou e veio a tropeçar quando foi tentar se
sentar na calçada, eu tentei impedir aquilo, mas acabei sendo puxado por ela e
nós dois rolamos pela calçada e terminamos deitados na calçada imunda e com as
poeiras das digitais de cada calçado que havia passado naqueles blocos.
Aquela situação
poderia ser vexatória para alguns, mas não ligávamos, tanto Selene quanto eu
havÃamos nos transformado em almas gêmeas que sujavam seus cabelos limpos no
chão e tÃnhamos a certeza de que não existia um grão daquela sujeira toda que
fosse maior ou mais belo do que as estrelas que brilhavam no céu que naquele
momento invadiam os nossos olhares e
mostravam que o infinito podia vir de dentro de cada um, transformando aquele
instante em eterno.
Não conseguÃamos
mais distinguir o momento certo disso acontecer, as pernas e o raciocÃnio já
não nos obedeciam e tudo começou a ficar mais distante. Nos guiamos apenas pelo
instinto, pelas luzes das estrelas e do luar, Selene voltou a passar sua mão em
minha barba enquanto meus olhos se
voltaram para os dela, refletindo a vontade de ficar, exteriorizada em um
beijo.
Nossos olhos
finalmente se fecharam, os lábios uniram, nossas lÃnguas sedentas à procura da
fonte de toda aquela vontade que saÃa do interior e se exteriorizava em nossos
corpos e as mãos, sim as mãos, eram convidadas de forma muito insinuante a
percorrer cada canto do corpo um do outro, e foram assim nos primeiros beijos,
naqueles primeiros minutos. Com o tempo fluindo foi diminuindo a intensidade, o
tato ia se dissolvendo a cada andar do ponteiro do relógio e a boca perdendo o
sabor e o movimento como se nós dois estivessem anestesiados.
Da mesma forma inesperada
como o encontro, acabamos a noite dormindo no chão frio e imundo, nos braços um
do outro. A felicidade estampadas em nossas faces enquanto dormÃamos transforma
toda aquela situação apenas em mero detalhe, pois já havÃamos conseguido o que
aprendemos com as estrelas, uma noite infinita.
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