Era uma vez certa dama faceira.
Andava por aí sem medo,
Intitulando-se grande feiticeira.
Por onde passava deixava pegadas,
Marcas permanentes,
Roupas ensanguentadas...
Cavalgava em busca de vingança.
Mas o quê não contava a ninguém:
Era apenas uma criança.
Assustada em meio à folhagem,
Um gato manhoso que soube
Do fim de teus dias de traquinagem.
Batimentos descompassados,
Olhos que mais pareciam faróis
Observando ao redor, vidrados.
A criança que morava ali
Se perdeu em fatídica noite.
Perdeu-se do amor, perdeu-se em si...
Procurou por si mesma por todo o globo,
Não estava na toca do coelho,
Muito menos a espreitar com os lobos...
Estava presa em seu lar...
O lugar em que cresceu,
Mas suas asas foram cortadas, impedindo-a de voar.
As montanhas de livros tornavam as noites mais animadas.
Em compensação à teus dias,
Resumidos à repreensões e palavras pesadas.
Era o próprio Quixote.
Criando monstros imaginários,
Indo em busca de um reconhecimento reconfortante...
Às vezes sentia-se como tão renomada princesa.
Em busca de um amor,
Gritando ordens a algum barqueiro em Veneza.
Via-se presa no Inferno de Dante.
Seu pecado? Todos eles.
Condenada a milênios de tortura agonizante.
Certas noites sonhava ser Beatriz
Inspirando ingleses desocupados,
Sendo eternizada no Paraíso por tua meretriz.
Podia atirar ao Egito alguma outra praga,
Tornado-se temida por um povo.
Ou apenas ser esculpida com alguma expressão vaga.
Questionava o que ela realmente era...
Criava essa persona forte para proteger-se.
Para não esperar o príncipe e ser temida como a própria fera.
Mas será que era mesmo detentora de tal bravura?
Ou a bruxa já foi algum dia,
Somente uma criança de quem roubaram a travessura?
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